sexta-feira, 15 de julho de 2016

MATÉRIA ESPECIAL


(foto: Solange Galante)


AVIAÇÃO REGIONAL BRASILEIRA

LUTA PARA SOBREVIVER


                                                                                                                            por  Solange Galante

A crise atual por que passa o Brasil só agrava a condição das empresas regionais e aumenta a quantidade de cidades sem linhas regulares.

No final de 2015, a Sete Linhas Aéreas anunciou a suspensão de seus voos regulares a partir de janeiro de 2016, mantendo atividade apenas dos serviços de táxi aéreo, raiz da empresa. É mais um passo do cruel desmantelamento da aviação regional brasileira que já vivia tempos difíceis há bastante tempo e nem mesmo com o anunciado Plano de Desenvolvimento da Aviação Regional, o PDAR, enxerga um céu de brigadeiro no horizonte. “O motivo foi uma soma de fatores”, afirmou Ériston Ricardo, o Comandante Erinho, diretor da companhia. Entre eles, a alta do dólar, sempre de forte impacto no mercado de aviação, problemas na infraestrutura aeroportuária e a lentidão do desenvolvimento do PDAR, que foi anunciado em dezembro de 2012 mas ainda não apresentou resultados práticos. “O combustível também não parou de subir, mesmo com a queda dos preços no mercado internacional. Devido à crise, houve uma retração na quantidade de passageiros e uma diminuição do valor das passagens numa guerra tarifária entre as companhias. Isso tudo se juntou e começamos a ter um prejuízo médio de R$ 500 mil por mês, que não conseguimos reverter. Diante disso, decidimos pela paralisação dos voos antes de chegar a um ponto em que não sobrariam sequer bens para fazer os acertos da empresa.” A Sete operava quatro aeronaves monomotoras C-208 Grand Caravan e três bimotores Brasília (todos aviões turbo-hélices) e transportou regularmente 80.935 pessoas no ano passado.



A SETE deixou de voar em janeiro deste ano. Voltou a ser apenas táxi aéreo.


(Foto: Divulgação)



PLANOS ENGAVETADOS

Crescer, aumentar a frota e a malha de rotas e tornar-se uma empresa regional (sob regras RBAC 121) é o sonho praticamente de todas as empresas de táxi aéreo (que voam sob RBAC 135) que já voam em caráter sistemático, isto é, com voos previamente programados e abertos ao público em geral como os das empresas regulares, e foi o início de várias regionais que já operaram no Brasil. No caso da Apuí, com sede em Manaus, ela opera dois voos sob regime sistemático, sendo um deles entre Manaus e São Gabriel da Cachoeira três vezes por semana e o outro entre Manaus, Manicoré e Apuí três vezes por semana, ida e volta, utilizando duas aeronaves turbo-hélices Embraer 110 Bandeirante, transportando cerca de 8.500 passageiros ao ano. Entretanto, segundo Vítor Marmentini, diretor geral da empresa, nunca tentaram se tornar uma empresa regional, devido à complicações da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Crescer também não está nos planos, ao menos por enquanto. “A minha certificação permite-me operar aeronaves até 30 lugares, como o Brasília, mas a demanda para essas localidades onde opero não comportam aeronaves grandes.” Ele reconhece que todo mundo tem ambições de crescer, começar com aeronaves pequenas e chegar até um ATR (com pelo menos 42 lugares) para operações regionais. “Só que aqui na nossa região, apesar de a gente ter distâncias quase continentais, não temos demanda, a população é pobre, não tem capacidade para pagar o nosso voo.” Vitor comenta que quando a empresa somente operava aeronave pequenas, falava-se que o cliente da região para o pequeno táxi aéreo era o doente, o morto e o prefeito. “Agora, na sistemática, existem alguns pequenos empresários que também são nossos clientes, os funcionários de todas as esferas, municipal, estadual e federal, vão de avião, na verdade quem tem quem pague, vai de avião, ele não tira o dinheiro do próprio bolso, mas se tiver uma empresa ou alguém que banque, logicamente ele prefere ir em uma hora de voo do que em 12 horas de lancha rápida.”
A Amazônia é a região que mais necessita de aviação regional. Lá, o transporte aéreo tem uma função social. O mesmo avião que leva pessoas para trabalhar carrega doentes aos hospitais. Por isso, a Amazônia é normalmente a exceção na avaliação de analistas do setor. Um deles, que prefere não se identificar, afirma que para ter ligações aéreas uma cidade precisa ter população, receita e distância de grandes centros, que as justifique. “Em São Paulo, por exemplo, nenhuma linha é viável com menos de 250 km de distância, devido à concorrência com a malha rodoviária. No Nordeste, essa distância é maior, vai pra 400, 450 km, porque a renda da população é muito mais baixa. Mas, no Norte, onde não há alternativa de transporte, é o contrário, não há estrada carroçável o ano inteiro. Portanto, lá, as distâncias de 200 km são viáveis porque a alternativa de transporte é apenas o rio. Assim, na Amazônia, distâncias menores se viabilizam pela falta de alternativa de transporte.”



A APUÍ opera a partir de Manaus para três cidades amazônicas.

(Foto: Ulrich F. Hoppe)

O transporte fluvial é o maior concorrente do avião na Amazônia. O barco é extremamente barato, embora extremamente lento, leva muitas pessoas e custa, segundo Vitor, da Apuí, cerca de 30% ou menos do valor da passagem aérea. Ele acrescenta que, por isso, foi desenvolvido na região um sistema de transporte chamado Ajato. “São lanchas grandes com capacidade para até 150 passageiros, e rápidas, viajando a 50 km/h enquanto que os barcos normais viajam a 10 km/h. O preço fica a aproximadamente 50% do valor do aéreo. Ou seja, nenhuma cidade onde essas lanchas alcancem irá viabilizar a aviação. Como a população tem baixa renda, ela não tem capital para pagar R$ 300,00 por uma passagem aérea de uma hora e prefere ficar 12 horas na lancha Ajato por R$ 150,00. Com isso, houve uma diminuição da demanda aérea especialmente nas localidades que atendemos e que não comportam aeronave grande.” A Apuí tem essa concorrência em Manicoré e em São Gabriel. “Para vc ter uma ideia, em Manicoré o Ajato leva 36 horas, a partir de Manaus, é uma viagem extremamente cansativa, o barco tem capacidade para 120 lugares e faz duas viagens por semana, lotado, com passagem de R$ 450,00. Já a nossa passagem aérea começa acima de R$ 800,00 indo até mais ou menos R$ 1.200,00, e são duas horas e 15 minutos de voo.” Vitor sabe que, ao mesmo tempo em que essa tarifa é excessivamente cara para o usuário, não sobra dinheiro para a empresa. “Meus passageiros dizem: ‘Poxa, mas por esse preço eu vou pro Rio de Janeiro’ e eu corrijo: ‘Bom, na verdade você vai e VOLTA do Rio... Com o detalhe de você estar viajando em um avião que vai a 900 km/h, com 180 passageiros, não em um que se locomove a 330 km/h com 14 passageiros, como o nosso.’ Portanto, eu transporto 30 vezes menos passageiros por quilômetro do que um Boeing e o meu piloto ganha similarmente ao piloto do mesmo Boeing, assim como meus equipamentos, as manutenções, é uma conta linear. Então, teoricamente, meu custo chega a quase 30 vezes mais do que o custo de um grande avião. Tem algumas contas que não são tão retas mas, com isso, eu consigo mostrar para eles porque meu preço é tão caro para o usuário e eu não consigo progredir mesmo assim, porque o modelo do meu negócio não é muito eficiente. E não tem outra forma de ser diferente, porque a cidade não nos oferece demanda para utilizarmos um avião maior, é como andar de táxi e de lotação...”



Na Amazônia a preferência ainda é pelo transporte fluvial, mais demorado mas mais barato. na foto, lancha Ajato.

(Foto: Divulgação/http://www.terminalajato.com.br)

“A alta do dólar fez dessa crise sem precedentes um complicador adicional considerável para o setor, que tem custo em moeda estrangeira” opina Décio Assis, gerente de Marketing da MAP, que alerta: “A queda de demanda atingiu o setor de taxi aéreo de forma brutal e levou muitos operadores a fazer voos bilhetados sem qualquer homologação e concorrendo de maneira predatória com empresas regionais, estas sempre exigidas em normas, taxas e procedimentos.” Claro que ele se refere às empresas de táxi aéreo sem autorização para operar linhas sistemáticas.
Como uma das empresas mais atuantes na Amazônia, a MAP, transportou em 2015 o total de 126.000 passageiros com seus quatro ATR modelos 42 e 72 – dois foram acrescentados à frota no ano passado. As rotas atuais ligam Manaus a Parintins, Itaituba, Santarém, Altamira, Belém; Manaus a Carauari; Manaus a Barcelos e São Gabriel da Cachoeira; Manaus a Tefé e Eirunepé; Manaus a Coari e, finalmente, Manaus a Porto Velho e Lábrea, todos destinos dos Estados do Amazonas, Pará e Rondônia. A empresa modificou sua malha em 2015, quando foram acrescentados os destinos Eirunepé, São Gabriel da Cachoeira, Barcelos, Tefé, Coari e Itaituba e paralisadas as operações para Manicoré e Humaitá, para regularização operacional. A empresa prevê, segundo informa Décio Assis, que novas cidades – Imperatriz, Teresina, Fortaleza, Cuiabá e Cacoal – passem a ser atendidas ao longo do ano, tão logo cheguem mais aeronaves ATR. Ele também observa que o fato da Sete ter deixado o mercado afetou muito pouco as operações da MAP. “As rotas que a Sete operava não conflitavam com nossa malha. Único caso é Altamira-Belém, onde o resultado foi impactado mais pela enorme queda na demanda em função da diminuição programada da atividade na construção da Hidrelétrica de Belo Monte.”



(Foto: Solange Galante)


A RIMA – Rio Madeira Aerotáxi, com sede em Rondônia, tem duas rotas sistemáticas, entre Porto Velho (RO) e Lábrea (AM) e Porto Velho e Cacoal (Rondônia) com sua frota de quatro monomotores Cessna Caravan. É uma das empresas que, segundo seu fundador e presidente, o Cmte. Gilberto Scheffer, aguardavam o PDAR entrar finalmente em funcionamento para alavancarem operações e se tornarem uma regional de fato, dentro do RBHA 121. “Essa foi a nossa expectativa, no início. Estamos tentando sobreviver no mercado dentro dos próximos dois anos. Nem planos de expansão temos, e agora há mais um agravante: a BR Aviation, que é distribuidora de combustíveis aqui no Norte repassou, se não me engano, 24 pontos de abastecimento para revendedores, o que significa que o combustível vai subir de preço, os pontos vão ser bandeira branca, quem tinha incentivo com a BR vai perder porque, se não é distribuidor, não tem como passar o incentivo do ICMS.” Esse é, segundo ele, o fato novo que começou a vigorar a partir de 1o de março passado em cidades como Ji-Paraná, Vilhena, Cruzeiro do Sul, no Acre, Tabatinga, Tefé e São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. “Se o PDAR já estivesse em operação, tínhamos uma proposta de ter dois turbo-hélices Sikorsky M-28 (aeronave turbo-hélice para 19 passageiros) mas, por enquanto, estamos em stand by”.




A RIMA quer o Sikorsky M-28 mas as condições de mercado ainda não permitiram trazer o avião para o Brasil.


(Foto: Divulgação/http://m28aircraft.pl)


Fábio Pazzetto, diretor comercial de outra pequena empresa, com sede em Santarém, no Pará, a Piquiatuba, que opera atualmente apenas aeronaves Caravan para linhas sistemáticas, comenta que a cidade paraense de Redenção ficou sem voos com a parada da Sete. “A prefeitura de lá nos convidou para fazer a rota mas, inicialmente recusamos, justificando: como operar transportando apenas cinco, seis passageiros? ‘Vamos lhe agradar, prefeito, mas daí a quente vai quebrar.’ Não há muitos aeroportos com movimento no Pará, que é um estado muito grande, porém, nem todos os aeroportos têm demanda, de uns 40 aeroportos funcionais no estado, não chega a ¼ disso os que efetivamente possuem demanda, o resto é movimento sazonal.”
No entanto, após um acordo com o governo de seu estado, e redução do ICMS sobre combustíveis para 10%, a Piquiatuba, já devidamente autorizada pela ANAC, prepara-se para iniciar voos sistemáticos entre Belém, Redenção e Marabá em agosto próximo. Mas os problemas ainda existem, tanto que Fábio Pazzetto também critica a infraestrutura aeroportuária. “Os aeroportos aqui no estado estão em estado de calamidade pública... Por exemplo, as obras em Novo Progresso pararam, não teve continuidade.”



A Piquiatuba é a empresa de táxi aéreo com operações sistemáticas que mais cresce na Amazônia.


(Foto: Solange Galante)


Falando em infraestrutura, existe até um jogo de empurra na administração dos aeroportos. “As prefeituras não querem ter essa responsabilidade mas querem que você faça o voo e o Estado não se diz habilitado para ajudar, enquanto que a União, através da Secretaria de Aviação Civil, também não ajuda. Ninguém quer cuidar da infraestrutura” explica Vitor, da Apuí. Além disso, o grande problema operacional na Amazônia é realmente combustível. “Além de ser caro, é difícil de transportar e eu tenho que levar comigo o combustível para retornar, em vez de levar carga paga. São Gabriel tem combustível, mas para Manicoré eu transporto querosene de aviação em tonéis para lá para podermos fazer nosso abastecimento por conta própria. Com isso, eu tenho limitação de peso de decolagem.” Ele reconhece que as prefeituras são pobres e têm uma lista tão grande de problemas que a aviação só é prioridade quando precisam usar, como energia elétrica, só vão sentir sua importância quando falta. “Operacionalmente, quem limpa os terminais, normalmente, são as empresas aéreas, na maioria dos municípios é assim, não atentam tanto para os cuidados que um aeroporto deveria ter. Lá em Apuí a nossa empresa mantém a limpeza do terminal, mas em Manicoré a prefeitura já ajuda, e em São Gabriel o administrador que está lá faz a limpeza. Em Apuí temos que prover tudo. E se formos pegar os 62 municípios do estado, eu acho que dez, incluindo Manaus, vão ter aeroportos bem cuidados, os demais estão tudo às traças...” Tem também, segundo Fábio Pazzetto, a questão cultural: como todo mundo usa barco, para trocarem o barco pelo avião a tarifa precisa ser muito atraente. “E no dia em que você aumenta a tarifa, o passageiro volta para o barco.”



A infraestrutura aeroportuária é um dos maiores problemas para a aviação regional, especialmente na Região Norte.


(Foto: Solange Galante)


Na outra ponta do segmento, a Total Linhas Aéreas, que operou como regional até 2008, quando passou suas operações com passageiros para a TRIP e, a partir daí, concentrou-se apenas em voos cargueiros, tinha ideia de retornar ao segmento em breve. Mas, como era de se esperar diante da crise e da desvalorização do real, os planos que estavam ainda no princípio, foram suspensos. A ideia era aproveitar seus turbo-hélices ATR que voam sob fretamento para a Petrobras na Amazônia, também em voos regionais na mesma área. “Agora, nós queremos ver o que acontece em 2016 e ficar quietinhos, esperando as turbulências passarem. Há muita insegurança em relação à economia.”


A Total nasceu como empresa aérea regional. Hoje é cargueira e possui alguns contratos de fretamento para passageiros mas gostaria de retornar ao transporte regular de pessoas. Não encontra, entretanto, condições.

(Foto: Divulgação)


A mais antiga empresa aérea regional que ainda se mantém em atividade é a Passaredo Linhas Aéreas. Fundada em 1995 ela vive momento de altos e baixos desde então e, atualmente, encontra-se em Recuperação Judicial, E tinha previsão de sair dessa tutela no segundo semestre deste ano. A empresa havia aderido à recuperação judicial pouco tempo antes do anúncio do PDAR, em 2012 e, segundo José Luiz Felício Filho, presidente da Passaredo, o plano de negócios da companhia não previa participar do plano governamental, por isso ela continua operando sem esperar pelas promessas feitas na ocasião. No entanto, ele reconhece que havia perspectiva de melhora da infraestrutura aeroportuária brasileira com o PDAR. “Como exemplo, ainda não há qualquer procedimento de pouso por precisão em aeroportos como os de Rondonópolis, Dourados e Araguaína.” Aliás, foi justamente no Aeroporto Maestro Marinho Franco, em Rondonópolis (MT) que, no início de janeiro um dos aviões da Passaredo sofreu um incidente que o danificou durante um pouso sob condições meteorológicas adversas. Felizmente, ninguém se feriu mas a aeronave foi retirada da frota operacional e afetou os voos da companhia, exigindo alterações profundas na malha, bem no meio da época de chuvas na Amazônia, que também tem provocado atrasos em diversos trechos operados pela empresa. Segundo Felício, o avião, tão logo volte a operar, ficará como aeronave reserva, pois a Passaredo já estuda reduzir sua capacidade de assentos, hoje disponível em 14 aeronaves ATR 72, além de ter feito outros ajustes na operação, como a redução de três para dois os voos de Ribeirão Preto para Belo Horizonte (Pampulha) e de dois para apenas um voo diário de Ribeirão Preto para Goiânia. Também estavam previstas reduções nos voos de Goiânia para Palmas e Palmas para Araguarina, totalizando, ao longo de 2016, 20% a menos de frequências em relação a 2015, tudo ocasionado pela falta de demanda. Nem mesmo a saída da Sete do mercado conseguiu beneficiar a companhia. Ainda assim, como garante Felício, “A Passaredo continuará focada no desenvolvimento da aviação regional.” Até quando der, é verdade, pois a empresa demitiu recentemente, centenas de funcionários, o que significa que a situação está bem complicada.




A Passaredo encontra-se ainda em recuperação judicial.

(Foto: Solange Galante)


No meio de tanta dificuldade e queda na demanda, ainda há quem olhe para potencial do país continente. Com isso, surgiu a Flyways. Segundo Ricardo Bürger, diretor geral da companhia, a nova empresa, sediada no Rio de Janeiro, finalmente começou a operar em 28 de dezembro passado com dois ATR 72-500. São três voos diários na rota Rio de Janeiro (Galeão)-Belo Horizonte (Pampulha), dois voos diário Belo Horizonte-Ipatinga e dois voos três vezes por semana Belo Horizonte-Uberaba e já há planos para voarem entre Pampulha-Araxá-Patos de Minas). “Não podemos contar com o PDAR, temos que contar com o que a gente já tem...” afirma Ricardo Bürger, que observa que o Aeroporto de Ipatinga estava sendo operado há 20 anos pela Usiminas mas foi entregue para o Governo de Minas Gerais em março. “É um aeroporto que necessita de algumas modificações, mas, em 2015, gerou mais de um milhão de passageiros. A Flyways também protocolou um acordo de entendimento com o Governo de Minas pelo qual atenderá 24 cidades (incluindo BH) nos próximos quatro anos. “Nesse primeiro ano já temos planos de atender dez cidades e operar 10 aeronaves na frota e planejamos ter 15 aeronaves em cinco anos.” O aeroporto Santos Dumont, bem como Vitória (ES) e o interior de São Paulo também estão na proa da empresa, sendo previsto que em agosto ela comece a operar daquele aeroporto carioca para Pampulha, bem como partindo também do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.




A Flyways é a mais recente tentativa de fortalecer a aviação regional brasileira.

(Foto: Vito Alexandre Cedrini)




O INTERESSE DAS GRANDES COMPANHIAS

Se regionais muitas vezes começam como táxi aéreos e sistemáticas, muitas companhias que voam hoje inclusive para fora do Brasil também nasceram como táxis e regionais. É o caso da Avianca Brasil, chamada antes Ocean Air, que atendeu durante bastante tempo e predominantemente linhas regionais. “Sempre defendemos e apoiamos a aviação regional, pois acreditamos que ela tem grande importância para o desenvolvimento do país” a empresa afirmou por meio da assessoria de imprensa. Sobre o PDAR, a Avianca acrescentou ainda: “Temos interesse de participar. Estamos aguardando as regulamentações da SAC para avaliarmos a viabilidade.” A Avianca Brasil opera em 24 aeroportos no país – além de um no exterior – dos quais cinco destinos são considerados regionais pelo critério da Secretaria de Aviação Civil: Chapecó, Ilhéus, Juazeiro do Norte, Passo Fundo e Petrolina. No momento, o planejamento da Avianca Brasil é fortalecer ainda mais sua presença em mercados já atendidos e não lançar novas bases.




A menor aeronave da Avianca que pode servir cidades de pequena e média demanda é o Airbus A318.


(Foto: Solange Galante)



Em dezembro de 2014, a maior companhia aérea do País, a TAM, anunciou que iria investir na aviação regional em 2015, independentemente da regulamentação do PDAR, pois isso já fazia parte dos planos estratégicos do Grupo LATAM, ao qual pertence. A companhia pretendia atender de quatro a seis destinos regionais adicionais por ano, a partir do ano passado. Inclusive, anunciou que as negociações com a indústria, incluindo a brasileira Embraer, fabricante da nova geração EJet2, já se encontram avançadas e poderia contemplar uma encomenda firme de 18 dessas aeronaves de última geração, além de 12 opções. Até o momento, a menor aeronave da companhia é o Airbus A319, para 144 passageiros.
Foi uma grande notícia para a aviação regional brasileira, considerando que a TAM nasceu desse segmento, que foi abandonando aos poucos, à medida que conquistava os mercados nacional e internacional. “Pela dimensão do nosso território, a aviação regional é vital”, reconhecia Cláudia Sender, presidente da empresa. Na ocasião do anúncio, ela, inclusive comentou que o desenvolvimento da infraestrutura de aeroportos em cidades de menor porte é mais importante para a TAM do que o modelo de subsídio que o governo pretender regulamentar.
Já se passou mais de um ano desde esse anúncio. O que aconteceu nesse período em relação aos planos da TAM? “Diante de um cenário desafiador, de volatilidade do câmbio, a nossa empresa segue avaliando de perto a evolução da demanda, planejando sua malha aérea com flexibilidade para permitir adequações às condições do mercado para gerar rentabilidade de suas operações aéreas” a TAM informou por meio de sua assessoria de imprensa. “Estamos trabalhando com horizontes mais curtos de planejamento e cenários mais flexíveis, em razão da falta de previsibilidade do cenário econômico e político.”
No entanto, apesar das dificuldades atuais, a TAM cumpriu, em 2015, o que prometeu em termos de criação de rotas regionais para aquele ano, ao iniciar de forma pioneira as operações em Jaguaruna (SC) e também estrear as operações em Bauru (SP), São José dos Campos (SP) e Juazeiro do Norte (CE), mostrando que permanece o interesse em expandir as operações para os mercados de menor densidade de tráfego. A empresa opera atualmente em mais de 10 aeroportos regionais com aeronaves próprias e reitera que suas decisões em relação à aviação regional independem do PDAR. No entanto, também entende que é preciso haver infraestrutura adequada para estimular essa demanda a preços competitivos e justificar o investimento de novas operações nas cidades médias brasileiras. Além disso, mantém o acordo de codeshare implementado com a Passaredo, que permite aos seus passageiros acessar mais nove destinos no Brasil: Araguaína, Barreiras, Cascavel, Dourados, Pampulha, Sinop, Três Lagoas, Uberaba e Vitória da Conquista. A TAM é a única das grandes empresas brasileiras a ter acordo com uma regional – a Passaredo – e afirma que está sempre atenta às necessidades dos clientes para iniciar, ampliar ou adequar suas operações, sendo que seus voos são constantemente avaliados conforme a demanda de cada região.




A TAM (hoje Latam) tem iniciado voos a algumas rotas regionais, utilizando aeronaves Airbus A319 (foto) e A320.

(Foto: Solange Galante)



Já no caso da Gol Linhas Aéreas, ela opera atualmente para 53 destinos nacionais, dos quais 23 são aeroportos regionais. Além disso, a companhia tem em seu planejamento iniciar de três a quatro novos destinos regionais a cada ano. “A Gol opera na aviação regional com suas aeronaves Boeing 737-700 com capacidade para 138 passageiros” informa Alberto Fajerman, diretor de Relações Institucionais e Comunicação da empresa. “A maioria dos aeroportos regionais em atividade no país estão aptos a receber este equipamento.” Ele acrescenta que a Gol apoia as iniciativas do Governo para ampliar o acesso dos brasileiros ao transporte aéreo, assim como faz desde a sua fundação. Mas, Fajerman ressalta, independente do PDAR, ela avalia constantemente possíveis bases no interior do país onde possa haver demanda pelos voos da companhia, tendo, por exemplo, um levantamento com cerca de 30 cidades com potencial para iniciar operação, sendo necessários apenas alguns ajustes ou reparos em seus terminais e estruturas para que os mesmos estejam aptos para receber os voos da companhia. “O setor aéreo é bastante sensível ao cenário macroeconômico ao qual está inserido. Trata-se de uma atividade com um custo elevadíssimo e, portanto, adequar-se à demanda faz necessário para a sustentabilidade da companhia. No caso da Gol, temos uma malha bastante dinâmica que nos permite acompanhar estes movimentos do mercado de forma bastante flexível”, finaliza o executivo.
Recentemente, e justificando sua decisão devido às consequências da crise econômica que domina o Brasil, a Gol desistiu de voltar a operar na cidade paulista de São José Rio Preto. A volta dos voos oferecido pela Gol partindo do aeroporto rio-pretense Prof. Eribelto Manoel Reino para Brasília e Guarulhos teriam início no primeiro semestre deste ano. A ANAC já havia autorizado a ligação aérea entre as cidades e só aguardava a data do início da operação que seria anunciada pela companhia aérea. A reestruturação da malha da Gol, que fechou também outras bases país afora, engavetou o plano.




A Gol Linhas Aéreas opera em pouco mais de 20 destinos considerados regionais. os equipamentos são o Boeing 737-700 e 737-800 (foto).


(Foto: Solange Galante)


Entre as empresa de malha nacional no Brasil destaque para a Azul, que é a que mais atende destinos de características regionais, especialmente após ter adquirido a TRIP, em 2012. Utilizando na maioria dos casos os turbo-hélice ATR 72, embora o Embraer 190 seja também uma aeronave voltada para mercados de média densidade e limitações de infraestrutura, a Azul opera atualmente em 101 destinos domésticos e quatro destinos internacionais. Antonoaldo Neves, presidente da companhia, observa que a Azul avalia constantemente sua malha aérea, realizando ajustes sempre que necessário, os quais podem ser motivados por diferentes quesitos, como demanda, ausência de infraestrutura etc. “Em 2015 foram inauguradas as bases de Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, e Divinópolis, em Minas Gerais. Dentre as cidades que deixaram de ser atendidas em 2015 estão Araguaína (Tocantins), Eurinepé e São Gabriel da Cachoeira (Amazonas), além de Macaé (Rio de Janeiro). Em fevereiro, foi anunciada a suspensão das operações no Acre a partir do dia 4 de abril. Até essa data era um voo diário, entre Rio Branco (AC) até Porto Velho (RO). A justificativa divulgada à imprensa foi de que a decisão se dá “em razão do cenário econômico desafiador observado atualmente no Brasil”.
Segundo Antonoaldo o maior desafio para sua companhia, especialmente na região norte, é operar em bases com menor demanda e com combustível três vezes mais caro. Embora ele afirme que a empresa continua com foco em desenvolver a aviação regional, colaborando para que mais cidades sejam servidas e mais pessoas tenham acesso ao transporte aéreo no país, revela que a Azul está, esse ano, reduzindo sua frota em 18 aeronaves, entre jatos e turboélices, porque o PDAR ainda não foi regulamentado e a demanda está mais fraca em todo o país. A frota atual da Azul compõe 140 aeronaves e está dividida, em sua maioria, por aeronaves adequadas para o mercado regional: 88 Embraer E-Jet 190 e 195 e 45 ATR 72-600, além dos sete Airbus A330 que fazem voos internacionais.



A companhia de cobertura nacional que mais opera destinos de pequena e baixa demanda no Brasil é a Azul. 


(Foto: Solange Galante)


Há quem defenda que o futuro da aviação regional é a parceria com as empresas grandes, para operarem como feeder das maiores, alimentando seus voos com passageiros do interior. Mas não é tão simples assim. “Seria, mas o problema é que as empresas grandes não querem” afirma Vitor, da Apuí. “Para qualquer coisa que você vai fazer existe risco e benefício. Se eu for uma feeder da empresa maior operando em uma pista que tem menos apoio daquelas onde a maior já opera, eu vou contribuir com 0,0 qualquer-coisa de passageiro para ela mas estaremos vinculando o nome dela à minha operação. Porque ela vendeu a passagem, vamos supor, de Manicoré para São Paulo e o trecho Manicoré-Manaus vai ser feito pela Apuí. O passageiro estará sob a responsabilidade da empresa maior naquele trechinho, e elas não querem isso. E é isso que nos dificulta isso porque a nossa demanda é muito pequena. Se fosse uma demanda significativa onde você pudesse chegar a um resultado na mesa dele, mas é muito pequena, a relação custo-benefício não vale a pena.” Trocando em miúdos, qualquer problema que ocorrer no trecho operado pela regional vinculada à empresa maior, seja um atraso, cancelamento de voo ou mesmo um acidente, poderá refletir negativamente para a empresa grande, em troca de pouco benefício: poucos passageiros transportados pela regional naquele trechinho. Fábio, da Piquiatuba, porém, defende o modelo: Estará se desenvolvendo uma empresa regional com uma empresa maior, robusta, do lado dando sombra, para ela. Regionalizar, por exemplo, no Norte, com a Piquiatuba, com a MAP... assim, sendo alimentadora, você tem condições de entrar no mercado e ter uma disputa interessante pelo passageiro e mais opções de assentos para baratear o custo.”
A Passaredo é hoje a única feeder de uma empresa maior, a TAM. Mas, segundo o especialista consultado por nossa reportagem, ela fez esse acordo com a Passaredo para manter esta pequena e dentro de um esquema controlado, porque ela alimenta as linhas da TAM, que a mantém limitada àquelas linhas que não são concorrentes então não é uma forma de desenvolvimento, é uma forma apenas de sobrevivência da Passaredo.



Muitos aeroportos do interior dependem de empresas aéreas regionais, associadas ou não à operação de grandes companhias, como é o caso de Ribeirão Preto.


(Foto: Solange Galante)



SEM ESPERAR PELO GOVERNO FEDERAL

Algumas iniciativas locais tentam suprir a necessidade que alguns municípios sentem quanto ao transporte aéreo. Em outubro do ano passado o governo do Rio Grande do Sul lançou seu Programa Estadual de Desenvolvimento da Aviação Regional. O objetivo é atrair o interesse de empresas aéreas para fazerem rotas dentro do estado gaúcho e fomentar o desenvolvimento econômico, social e turístico do mesmo. O que é oferecido para atrair as empresas? Concessão de incentivos fiscais para as companhias que aderirem ao programa, desde que garantam a operação de rotas regionais que atendam quatro ou mais municípios. Será também preciso que as empresas aéreas promovam e incentivem pacotes para roteiros turísticos e eventos no Rio Grande do Sul. Em síntese, esse plano concede isenções fiscais na querosene para empresas aéreas que aderirem ao programa de voos nos aeroportos regionais do Rio Grande do Sul, sendo que a companhia aérea que operar voos até seis municípios do interior pode reduzir o ICMS do combustível até para 7%. E segundo o governo do Rio Grande do Sul, já está surtindo efeito, pois a primeira companhia a aderir oficialmente à iniciativa foi a Azul Linhas Aéreas, que assinou o termo de acordo com o Estado. A empresa já oferecia voos para as cidades de Santa Maria, Pelotas e Passo Fundo e começou, em seguida, a dispor de uma linha para Uruguaiana. A rota entre Uruguaiana e Porto Alegre estava suspensa há dois anos e meio. Isso significa reduzir de oito horas de viagem por estrada para pouco menos de duas horas, por avião. O decreto 52.607 de 16 de outubro de 2015 visa permitir que todos os municípios gaúchos tenham, até 2017, um aeroporto operando voos regulares no raio de até 180 km. São considerados voos regulares regionais os realizados com frequência mínima de quatro por semana com aeronaves com capacidade até 120 lugares.
No entanto, o analista consultado pela revista Flap insiste que 180 km é muito pouco. “Demanda não surge por decreto”. Ele ainda derruba o mito de que, se tínhamos no passado mais cidades brasileiras interligadas por aviões, deveríamos, hoje, voltar a ter uma malha assim: “Hoje em dia, as ligações terrestres são bastante razoáveis para o Brasil todo. Não são mais como em 1950 quando havia uns 330 destinos... e foram cortados por quê? Porque foi o período em que as estradas começaram a ser asfaltadas. Então passou a haver uma alternativa. Na época, o ônibus custava um terço do custo do avião. Hoje em dia, em viagens de longa distância, custa a mesma coisa ou até mais caro, por exemplo, para o Nordeste, principalmente com as tarifas promocionais dos aviões. Entretanto, em distâncias curtas, experimente criar uma linha com avião, entre São Paulo-Santos, por exemplo, onde existem duas estradas asfaltadas entre as duas cidades: sairá muito caro. Por isso que, para ter linha aérea, é imprescindível ter distância de centros importantes, população e renda, senão não precisa de voo.”




Iniciativas estaduais têm atraído aeronaves ATR como as da Azul, na foto, em Lages (SC).


(Foto: Solange Galante)


Também no caso da paraense Piquiatuba, que inicialmente reduziu as operações, tirando das rotas regulares sistemáticas duas aeronaves Brasília. “Não operamos mais o Brasília para passageiros porque não tem tido demanda, não vale mais a pena. Suspendemos essa operação em dezembro passado, hoje eles só transportam carga para os Correios, à noite. Já nossos Caravans transportam passageiros regulamente entre Belém e Novo Progresso, passando por Santarém e Itaituba ou estão sob contratos de fretamento” explica Fábio Pazzetto. Mas as iniciativas locais dos governos do Piaui e do Pará, reduzindo o ICMS respectivamente para 2,5% e 10% levaram a Piquiatuba a criar as ligações entre Teresina, Parnaíba, Picos e São Raimundo Nonato (PI) já em funcionamento e a aqui já citada Belém-Marabá-Redenção prestes a começar. Mais dois exemplos de atitudes estaduais tentando suprir o que o governo federal ainda não tornou prático: o então tão festejado PDAR.



A Piquiatuba conta com ICMS reduzido ao operar no Pará.


(Foto: Solange Galante)


Por sua vez, o Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (DAESP) administra 26 aeroportos em todo o Estado de São Paulo. Deste total, seis são focados na aviação regular comercial e vinte na aviação executiva e de táxi aéreo. Os aeroportos que recebem voos comerciais são: Ribeirão Preto, Bauru/Arealva, Marília, Presidente Prudente, Araçatuba e São José do Rio Preto. O Daesp realiza constantemente investimentos para que esses aeródromos, que apresentem toda a infraestrutura necessária para atender a demanda atual e futura. No caso da companhia área manifestar interesse em opera e obter a autorização da ANAC, como informa o DAESP, os aeroportos estão aptos a atender as demandas das empresas. Os investimentos em todos os aeroportos da rede do Departamento foram realizados pelo Governo do Estado de São Paulo. O governo federal, através da Secretaria de Aviação Civil, anunciou, em 2012, investimentos em 11 aeroportos administrados pelo órgão estadual, sendo que foram contemplados no programa Presidente Prudente, Araçatuba, Marília, Bauru/Arealva, Franca, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Araraquara, Ourinhos, Registro e Sorocaba. No entanto, as licitações prometidas para 2014 não foram realizadas até o momento por parte do governo federal e o DAESP investiu sozinho, de 2011 até o momento, mais de R$ 80 milhões naqueles seis aeroportos regionais citados, com obras em pistas, pátios, equipamentos e ampliação de terminais, serviços de combate a incêndio, estacionamento de veículos, e conforto ao passageiro, em geral.





O DAESP administra aeroportos como o de Presidente Prudente (acima) e de Araçatuba (ao lado)






(Fotos: Divulgação)






A LENTIDÃO DO PDAR E A FALTA DE DINHEIRO

Quando foi lançado pela presidente Dilma Roussef, a garantia era de que não faltaria dinheiro para o desenvolvimento da aviação regional brasileira. Em janeiro de 2015 o Congresso Nacional aprovou a Lei 13.097, pela qual foi regulamentado o PDAR, prevendo os subsídios e adequação dos aeroportos desse segmento. Porém, os recursos previstos para a implementação de novas rotas regionais no âmbito do Programa podem ser insuficientes. Conforme cálculo realizado pela CNT (Confederação Nacional do Transporte) e publicados no ano passado por meio do estudo “Transporte e economia: transporte aéreo de passageiros”, somente nos cinco primeiros anos do programa, seriam investidos R$ 4,5 bilhões – mais da metade dos recursos disponíveis do FNAC (Fundo Nacional da Aviação Civil) – para as rotas já operadas. Sobrariam apenas R$ 2,4 bilhões para novas ligações aéreas. A subvenção prevista na Lei nº 13.097/15 deverá ser feita com recursos do FNAC, mas apenas 30% podem ser destinados ao PDAR.
Dinheiro é justamente o que falta para o primeiro voo comercial decole de Paracatu, no interior de Minas Gerais. O município tem muitas jazidas de ouro, universidades privadas que criaram mais de duas dezenas de cursos superiores nos últimos anos e tudo indica que o mercado é muito promissor. A prefeitura cuidou do terminal de passageiros do Aeroporto Municipal Pedro Rabelo de Sousa – que está na lista dos selecionados do PDAR – e até mesmo um moderno aparelho de raios-x para inspecionar bagagens foi adquirido. Mas faltava, em novembro do ano passado, o investimento de R$ 33,6 milhões prometido pelo governo federal. Segundo o secretário municipal de gestão, Erasmo da Silva Neiva, “O planejamento indica demanda suficiente para recebermos Boeing 737 e Airbus A320 até meados da próxima década” mas faltam reformas na pista, um novo pátio para o estacionamento de quatro aeronaves e sistema de balizamento.
A mesma espera existe no Nordeste. Dos nove aeroportos cearenses contemplados pelo PDAR, pelo menos três devem enfrentar atrasos e dificuldades devido ao contingenciamento de recursos do FNAC. A falta de recursos deverá atingir especialmente os aeroportos de Canindé, Itapipoca e Sobral, que serão construídos do zero. No caso de Sobral, o local para o novo aeroporto já foi aprovado pela Secretaria de Aviação Civil e estudos complementares do Estudo de Viabilidade Técnica foram demandados, mas ainda não se sabe se, quando for iniciada a construção, haverá recursos disponíveis.
Os contratos firmados entre a ANAC e os consórcios vencedores das licitações aeroportuárias realizadas nos últimos anos a nível federal determinam duas formas de recursos para o FNAC. Além do valor de outorga (uma contribuição fixa), as concessionárias deverão pagar, anualmente, uma contribuição variável que incidirá sobre a receita bruta. Em relação aos aeroportos de Campinas (Viracopos), Guarulhos, Brasília, Rio de Janeiro (Galeão), Belo Horizonte (Confins) e Natal (São Gonçalo do Amarante) a contribuição fixa anual – que terá correções anuais com base em indicador definido em contrato – é de respectivamente R$ 127,36 milhões, R$ 810,65 milhões, R$ 180,04 milhões, R$ 760,75 milhões, R$ 60,66 milhões e, no caso do Aeroporto de São Gonçalo do Amarante, o pagamento da contribuição fixa terá início apenas agora em 2016. A Contribuição variável (% da receita bruta) é de respectivamente 5%, 10%, 2%, 5%, 5% e 6,8 %. Para o ano de 2015, quando o estudo da CNT foi produzido, esperava-se que fossem arrecadados cerca de R$ 53 milhões a título de contribuição variável. O aeroporto com maior aporte desse tipo é Guarulhos, com contribuição estimada em R$ 28,20 milhões no ano. O FNAC, unidade gestora dos recursos arrecadados, recebeu, de 2013 até agosto de 2015, R$ 8,86 bilhões para investimentos no setor aeroviário brasileiro. No mesmo período, as despesas do fundo totalizaram R$ 4,86 bilhões. Todas as despesas têm como favorecidos a Infraero e o Banco do Brasil. Contudo, todo o capital destinado ao Banco foi repassado à Infraero. Em média, 60,4% das despesas são destinadas ao aporte da Infraero às Sociedades de Propósito Específico – SPEs – que nada mais são do que as empresas formadas pelos consórcios vencedores dos leilões de concessão, ou seja, as responsáveis pela gestão dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos, Brasília, Galeão e Confins, das quais a Infraero possui 49%. Dessa forma, segundo o estudo, observa-se que apenas 39,6% dos recursos gastos no âmbito do FNAC foram investidos em aeroportos administrados isoladamente pela Infraero. “Ou seja, apesar de o objetivo do fundo ser o de desenvolver e fomentar a aviação civil e infraestruturas aeroportuária e aeronáutica civil, a maior parcela dos recursos está sendo destinada a apenas cinco aeroportos. Isso reduz os benefícios possíveis para o sistema de transporte aéreo nacional.” E, reparem, retornam a cinco daqueles seis aeroportos que contribuem para manter o FNAC.
O agravante atual para essa situação é o calote que o Aeroporto de Guarulhos, por meio da concessionária GRU Airport, ameaça dar no Governo Federal, conforme anunciado há algumas semanas. Ela deveria pagar R$ 1 bilhão pela outorga de concessão até o dia 11 de julho, mas por meio da Associação Nacional das Administradoras de Aeroportos (Aneaa), já tinha solicitado adiamento do pagamento devido à crise financeira. Do total de R$ 2,3 bilhões que devem ser repassados à ANAC pelas concessionárias, R$ 1,016 bilhão são do aeroporto de Guarulhos.




Aeroportos concessionados, como o GRU Airport, o maior do país, devem à União e isso pode prejudicar os investimentos na aviação regional.

(Foto: Solange Galante)



PALAVRA DA SAC

A reclamação de todos os envolvidos no setor é que, após três anos do lançamento do PDAR, nenhum aeroporto regional saiu do papel. A SAC nega que o Programa esteja engavetado e se justifica demonstrando que são várias as fases por que passam os aeroportos: estudos de viabilidade técnica, estudos complementares, estudos preliminares, anteprojeto para licenciamento ambiental e, só depois, licitação e obras. Vários já estão, segundo a Secretaria, inclusive, tratando do licenciamento ambiental. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Secretaria de Aviação Civil informa que, até o momento foram investidos R$ 244 milhões no programa, com 80 Anteprojetos (AP) autorizados que possibilitarão o início de licitações ainda em 2016 (lista na íntegra em  http://www.aviacao.gov.br/assuntos/aviacao-regional/tabela-anteprojeto.pdf) Destes mais de 80 aeroporto, 12 teriam licença ambiental já emitida, como por exemplo Barreiras (BA), Sinop (MT), Caruaru (PE), Maringá (PR), Angra dos Reis (RJ), Ji-Paraná (RO), Marília (SP), Ribeirão Preto (SP) e Araguaína (TO). Obras já foram entregues em aeroportos regionais por meio do Programa Federal de Auxílio a Aeroportos (PROFAA) da Secretaria de Aviação. Como um dos exemplos, no aeroporto regional de Santo Ângelo (RS), seria entregue em março a reforma da pista, táxi, pátio e obras complementares. Com essas obras, segundo a SAC, serão beneficiadas mais de 250 mil pessoas que residem a até 50 km do aeroporto. Segundo um Estudo de Demanda feito pela Universidade Federal de Santa Catarina encomendado pela SAC, somente esse aeroporto gaúcho, como um dos 270 aeródromos contemplados no Programa, 17 municípios próximos à região dependem exclusivamente dele. Em Vitória da Conquista (BA), as melhorias foram para a construção de um novo aeródromo com pista, táxi, pátio, rampa de equipamentos, cerca, subestação elétrica, SCI, drenagem, sinalização horizontal e vertical, balizamento noturno e acessos viários, além de um Terminal de Passageiros construído do zero. Segundo aquele mesmo estudo da universidade catarinense, 19 municípios são influenciados pelo aeroporto da região. Outros aeroportos brasileiros também foram beneficiados com obras já entregues: Fernando de Noronha, Cascavel, Correia Pinto, Tabatinga, Tefé e Santarém – os três últimos com investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 



Aeroporto de Santarém, no Pará: beneficiado com investimentos do PAC.

(Foto: Solange Galante)


Enquanto isso, a Secretaria de Aviação está trabalhando na regulamentação da Lei dos Subsídios, outra vertente do PDAR, que reduzirá os custos de operação de rotas regionais. Primeiramente, serão subsidiados os voos com origem e/ou destino em aeroportos da Amazônia Legal – prioridade do programa de Aviação Regional pelo seu caráter social. O objetivo é aumentar o interesse das empresas aéreas já existentes, estimular a criação de novas companhias, expandir a malha aérea do País, reduzir os preços das passagens e ampliar o fluxo de passageiros para cidades fora dos grandes centros urbanos. Atualmente, uma passagem entre rotas regionais chega a ser 31% mais caras que os trechos operados entre capitais. A regulamentação pretende normatizar o subsídio de até 60 passageiros ou 50% da ocupação de uma aeronave maior, em todo o País (à exceção da Amazônia Legal, em que o limite de 50% não se aplica), além de subsídios nas tarifas e rotas em aeroportos com movimentação anual de 800 mil passageiros.

ENTÃO, QUAL É O CAMINHO?

“O PDAR não é necessário” defende o analista do setor que entrevistamos e prefere não se identificar. Ele afirma que o ideal para as linhas regionais é que grandes empresas como a Azul, a Gol e a TAM, que já têm serviços em cidades secundárias, mantenham esses voos, porque elas têm a capacidade financeira e conhecem como fazer o serviço com qualidade. Em alguns casos, atender uma cidade pequena como escala de uma linha importante, não com um voo isolado até ela, a não ser que a companhia realmente se interesse por essa rota. “E não precisa haver companhia regional, nem a companhia regional ter subsídio, o mercado é que tem que ser livre. Podem existir pequenas empresas independentes que possam servir algumas linhas como no interior da Amazônia, como parte de uma linha importante, como ponta de linha. Em alguns lugares podem existir empresas locais, de utilidade pública. Companhias regionais são importantes se forem bem estruturadas, e normalmente não são.” Além das, aproximadamente, 130 cidades ligadas hoje por avião, as demais cidades, segundo ele, não precisam de transporte aéreo simplesmente porque não têm demanda. Mas, na atual crise do Brasil, a demanda das cidades, grande e pequenas, está caindo e, se existiu há dois anos esse projeto de construir ou reformar 300 aeroportos, na crise atual isso não se justifica, não precisa fazer nenhum, basta conservar os que já existem, porque não há demanda para crescimento. Se a cidade precisa de avião é porque ela tem receita, porque se não tem receita, não precisa de avião. Uma coisa são as linhas, outra coisa são as companhias.”
“Acho que o governo deveria olhar com bons olhos a questão do desenvolvimento aéreo” comenta Fábio, da Piquiatuba, que já foi sondada pelo Ceará e Tocantins para fazer rotas sistemáticas a exemplo do que começou a ser feito no Piauí, mas, como empresa de táxi aéreo, a Piquiatuba é limitada a apenas cinco rotas sistemáticas – Fábio defende que deveria haver o limite de dez rotas. Não bastasse essa limitação, há concorrência predatória. “Uma empresa pequena liga, por exemplo, Araçatuba a São Paulo, daí vem uma grande com um avião com o dobro de lugares e mata uma pequena empresa que poderia crescer e disputar mercado, ofertar mais assentos e baixar o preço da tarifa. O que acontece hoje no Brasil? Não nasce nenhuma empresa e, se nasce, pode morrer prematuramente. Acho que deveria ter subsídio contra os altos custos e uma espécie de proteção no sentido de, se uma empresa grande quer entrar, deve praticar uma regra que não prejudique a pequena que está se desenvolvendo, senão não há geração de emprego. Sem isso, não se tem muito o que fazer.”


O setor continua aguardando o que o motive para que o desaparecimento recente de empresas como a Brava (sucessora da gaúcha NHT) e Sete não se repita e que não aconteça o que diz José Luiz Felício Filho, presidente da Passaredo: “Alertamos que, quando nascer o PDAR, poderá não haver mais regionais.” E é assim o setor luta para sobreviver.



Qual será o futuro da  aviação regional brasileira?


(Foto: Ulrich F. Hoppe)

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